Uma das mudanças mais anunciadas de 2016 finalmente aconteceu nos primeiros dias de maio. Após votação na Câmara dos Deputados e no Senado, a presidente Dilma Rousseff (PT) foi afastada do cargo no processo de impeachment que paralisou o País nos últimos meses. A partir de agora, quem assume o desafio de tentar recolocar o Brasil nos eixos é o presidente interino Michel Temer (PMDB). O único consenso em um Brasil extremamente dividido é de que o trabalho não será fácil.
Em reportagem publicada na Agência Brasil, a jornalista Giselle Garcia exemplificou o tamanho dos problemas que Temer terá de enfrentar nos próximos meses. Dilma Rousseff ficará afastada por, no mínimo, 180 dias.
O cenário herdado pelo presidente interino é extremamente diferente daquele visto em 2007, quando o Brasil anunciou a descoberta das reservas do pré-sal. À época, a confiança de que o País finalmente decolaria rumo ao “primeiro escalão” internacional era grande. No mesmo ano, o PIB crescera 6,1% e a inflação, um mal que sempre assombrou os brasileiros, havia recuado para 3,6%, o índice mais baixo desde 1998. A economia crescia, o consumo impulsionava diversos setores, a democracia mostrava-se pujante e o Brasil enxergou anos de ouro pela frente.
A alegria, no entanto, durou pouco. Menos de uma década mais tarde, o Brasil parece ter sido golpeado em todas as frentes. Em 2015, o Produto Interno Bruto (PIB) foi negativo em 3,8%, a pior retração em 25 anos. A inflação também voltou a assombrar e o desemprego, que em 2007 sequer preocupava os brasileiros, passou dos dois dígitos e agora já são mais de 10,4 milhões de desempregados.
Em entrevista à Agência Brasil, o fundador da consultoria para mercados emergentes EM+BRACE, Roberto Abad, avalia que o novo governo terá de começar tudo de novo, além de provar ao mercado que as políticas econômicas propostas são sólidas. Isso, segundo Abad, levará certo tempo.
“Foram anos para que o Brasil recebesse grau de investimento das agências de classificação de risco para que o mercado acreditasse que o milagre estava acontecendo”, avalia Abad, em referência ao recente rebaixamento das notas do País pelas três principais agências internacionais (Standard and Poor’s, Moody’s e Fitch).
Giselle Garcia aborda o plano Ponte para o Futuro, uma plataforma econômica apresentada por Michel Temer em outubro, quando ainda era vice-presidente. As medidas foram bem recebidas pelos mercados financeiros, mas recebeu críticas de sindicalistas. “Estão previstas reformas, como a previdenciária e trabalhista, e mudanças na Constituição para permitir um corte profundo nos gastos do governo. O documento prevê ainda maior abertura ao capital estrangeiro. O objetivo é criar condições para que o Brasil alcance um desenvolvimento sustentado de 3,5% a 4% ao ano na próxima década, meta desafiadora para uma economia que deve sofrer contração de 3,8% este ano”, explica a jornalista.
Há quem avalie também que a reação das ruas às medidas deverá ser determinante à implementação do pacote de mudanças. “Vai haver uma boa vontade inicial, uma fase de lua de mel. Mas do ponto de vista das ruas, Temer não representa grande mudança. Não sabemos se as manifestações vão parar”, afirma o cientista político Anthony Pereira, diretor do King’s Brazil Institute, em Londres.
Diante das pressões e das incertezas em relação aos próximos meses, analistas consultados pela Agência Brasil apresentam dúvidas em relação à efetividade da recuperação. “Vejo uma recuperação lenta pois os pilares do crescimento estão ruindo na nossa frente. A previdência social é insustentável, a dívida pública não para de crescer e há uma paralisia no setor produtivo”, afirma o economista Marcos Casarin, da Oxford Economics.
Casarin sustenta, inclusive, que a Previdência deverá representar um dos desafios iniciais de Temer na área econômica. Isso porque os gastos com a Previdência Social já chegam a 44% do total de despesas primárias do governo, enquanto a população brasileira mal começou a envelhecer. O brasileiro tem, em média, 31,1 anos e os alemães, por exemplo, têm, em média 47,5 anos.
“A taxa de natalidade diminui e a expectativa de vida aumenta rapidamente. É insustentável. É preciso elevar a idade mínima para aposentadoria e mudar a regra de indexação. As aposentadorias não deveriam ser indexadas ao salário mínimo, mas à inflação”, explica o especialista.
Aumentar a produtividade
Outro desafio do Brasil nos próximos anos será reverter os baixos índices de produtividade, que impactam principalmente a indústria de manufaturados. Quando passamos pela supervalorização do real perante o dólar, tivemos de encarar também um aumento no consumo de produtos importados, o que desestabilizou a balança comercial. Os produtos brasileiros perderam competitividade e a indústria só conseguiu respirar quando o real desvalorizou-se novamente.
“A indústria, já abatida, teve que se adaptar da pior forma possível: cortou gastos e demitiu funcionários”, diz Luiz Fernando Furlan, ministro de Desenvolvimento, Indústria e Comércio no governo Lula, em entrevista à Agência Brasil.
Com a mudança na direção do País, os líderes empresariais de diversos setores reforçam a esperança de que o Brasil promova mudanças para reduzir a burocracia no ambiente de negócios, bem como reformar o sistema tributário. Diante de tantas incertezas, é preciso, portanto, acreditar que a situação irá melhorar.